Animais considerados excedentes em zoos são assassinados e dissecados em frente ao público
Embora a prática de matar animais em zoos – por supostos controles populacionais – não se restrinja à Dinamarca, a prática em outros lugares tende a ser ocultada, se não negada. No país, os animais assassinados são enxergados como “oportunidades educacionais” e como carne para outros animais em cativeiro.
As funcionárias ficaram satisfeitas com a dissecação. Elas tinham uma confiança aberta, séria, fundada, em parte, em dois anos passados como guias de passeios no zoo e responsáveis por alimentar leões-marinhos. Mas nenhum delas dissecara um mamífero maior do que um rato. Por isso, prepararam uma sessão de estudo – levando café, livros de referência e um laptop cuja imagem de tela era projetada em uma parede, logo acima de um leão de pelúcia. Tinham visto um vídeo de YouTube de uma dissecação anterior de um leão em Odense.
“Não é realmente diferente de um rato, exceto o tamanho”, disse Jepsen. “Há mais cortes,” respondeu Dahl.
Elas estavam preocupadas que o leão poderia não descongelar completamente antes do dia marcado. Um colega, passando pelo quarto, tranquilizou-as de que o esterno de um leão era “mais fácil de cortar do que sorvete fora do congelador”.
O leão morto estava em um chão de concreto de uma pequena sala vazia que é normalmente usada para preparar comida para os carnívoros do zoológico. Ao lado, havia um quarto repleto de restos de cavalos; o zoo havia matado os animais depois de serem doados por membros do público.
Após assistirem à dissecação de um leão, crianças são incentivadas a cortar ratos mortos/Foto: Mitch Epstein
A língua do leão estava saindo da boca e algumas gotas de sangue viscoso haviam sido derramadas. O leão estava descongelado em grande parte e pairava um cheiro azedo no ar. No público, bebês com chupetas foram distraídos do sangue e da pele por leões-marinhos nadando em uma piscina logo atrás da dissecação. No primeiro plano, os intestinos não misturados e uma bexiga com urina congelada foi mantida sob a luz. Depois, houve uma decapitação com esforço e Dahl tentou cortar vértebras, usando uma faca com as duas mãos.
“Você tem que encontrar a pequena abertura e empurrar a faca para baixo, entre os nervos e qualquer outra coisa”, Dahl explicou mais tarde.
No final de uma hora, Jepsen pousou a cabeça do leão, que ela tinha segurado e disse: “Esperamos que vocês aprendam alguma coisa sobre o leão e vocês mesmos.” Houve aplausos calorosos.
À medida que a multidão se dispersava, uma dúzia de crianças se reuniu à mesa, onde os órgãos internos do leão estavam ao lado do que restava de seu corpo. Ao ver um osso sendo cortado, uma garota se debulhou em lágrimas.
Um funcionário do zoológico aguardava com uma lata de lixo de plástico sobre rodas. Referindo-se aos restos do animal como carne em vez de como um cadáver de leão, ele perguntou se era hora de limpar. Ele puxou a cauda do leão e Jepsen empurrou a outra extremidade. O corpo decapitado deslizou para o lixo.
Em 2014, pouco depois de Marius, a girafa, ter sido baleada em Copenhaguen, um profissional de um zoológico britânico teve uma conversa com Bengt Holst, diretor científico do Zoo de Copenhaguen e as políticas de morte e dissecação do zoológico. Ele perguntou a Holst: “Que diabos você estava pensando?”
Os diretores de zoológicos nos Estados Unidos e na Europa têm uma obrigação recorrente, em grande parte desconhecida pelas pessoas que dirigem galerias de arte e parques de diversões, de tentar argumentar o porquê da existência de suas instituições.
A perna de uma girafa, apoiada em um freezer ao lado de caixas de alimentos para animais no Zoológico de Odense/ Foto: Mitch Epstein
A exploração contínua dos animais exibidos, impedidos de fazer muito do que fazem em ambientes naturais – reprodução, caça, caminhadas – é continuamente defendida.
Isso aconteceu mesmo depois da morte de Marius ou da morte, em maio de 2016, de Harambe, um gorila no Zoológico de Cincinnati, baleado e morto depois que um menino de três anos entrou em seu recinto.
A moderna defesa dos zoológicos tende a se referir a quatro argumentos: educação, conservação, pesquisa científica e o benefício social de levar as pessoas para fora da casa.
Um zoológico moderno espera contar uma história de refúgio e empatia. Porém, o desmembramento de uma girafa, observado por crianças sorrindo, sugere uma realidade completamente oposta.
No Zoo de Copenhague, leões vivem ao lado de camelos e o escritório de Holst e do lado de fora de uma das vias principais o local conduz dissecações ao ar livre.
Em 2012, Holst assumiu a presidência do Conselho de Ética Animal da Dinamarca, que aconselha o governo sobre questões como clonagem, zoofilia e mortes em matadouros. Antes da morte de Marius, Holst não era uma figura pública. Hoje, ele tem uma pasta de email reservada para as ameaças de morte que recebe.
Depois de Marius ser morta, a atriz Kirstie Alley twittou, “Oh meu deus, vi vários abusos em minha vida, mas este bebê girafa assassinado no Zoológico de Copenhaguen é esmagador”.
Na página do zoológico no Facebook, alguém postou:” Este lugar é um inferno na terra. Os ‘seres humanos’ que trabalham lá são o “excedente” real na sociedade”.
Quando o apresentador Matt Frei perguntou a Holst: “Se você permitiu que os alunos – algumas crianças muito pequenas – assistissem ao desmembramento da girafa morta, por que não os convidou para ver o assassinato?” Holst argumentou: “”Não há educação em ver o assassinato, mas os alunos podem realmente aprender muito com a autópsia”.
Com Marius, o Zoológico de Copenhague foi capaz de reforçar sua lealdade a uma vertente de excepcionalismo animal dinamarquês. O maior matadouro de porcos da Dinamarca, por exemplo, está aberto ao público, e 150 pessoas visitam-no todos os dias, segundo a revista New Yorker.